A dança do Vilarejo Libanês
         
Por Tarik Murad- Jornal O Mundo Proibido
          A dança acontece em uma vila cheia de macieiras e plantações de uva e se refere à colheita do mês de Setembro, todos os anos, nos vilarejos do Líbano, onde os moradores seguem as tradições dos seus ancestrais. Esses vilarejos são famosos, por tais tradições, cultuadas até hoje, como homenagem aos descendentes e parentes queridos, que as levam de geração em geração.  É claro que há algumas modificações, como em qualquer costume, mas o básico da tradição é respeitado até os dias atuais. Muito desse costume consiste na cooperação da família e nesse caso, toda a Vila se torna uma comunidade.
          Em meados de setembro, diversas famílias se encontram em seus campos, ou suas casas, para celebrarem a temporada da colheita do vinho. As uvas colhidas das parreiras são separadas em grupos, umas para fazer Arak, que é um aperitivo alcoólico, que mesmo proibido, não deixa de ser consumido por famílias tradicionais. Parte desta é destinada ao vinho, outras para o consumo natural, além das que são destinadas aos doces. Só se consegue sentir o aroma do suco de uva quando ele está sendo aquecido ao fogo. Algumas mulheres recheiam suas travessas com tabouleh, a salada conhecida no Brasil como tabule, e hummus, uma pasta de grão de bico; e babaghanouj, ou berinjela recheada com alho, amendoim, entre outros ingredientes e banhada no óleo. É uma conserva. Tais alimentos são consumidos juntos a essa bebida. Além de ter como acompanhamento folhas de uva, petiscos, frutas e pães, principalmente, o sírio.
          Em meio à cerimônia, outras mulheres passam com elegância com seus jarros na cabeça. Pode ser desse balanço que as mulheres árabes acrescentaram a dança dos jarros às tradicionais festas árabes.
Os jovens vão com suas mães conhecer os membros mais velhos da família nos campos. Essa é a única oportunidade que eles têm de conviver com seus avós, bisavós e parentes mais distantes. As mulheres, além de se vestirem com roupas chamativas e longas, usam véus e adornos na cabeça.
 Confesso que pensei que encontraria lá a mulher que tanto me encantou. Por um momento, imaginei tê-la avistado, mas, depois percebi que era outra. Para minha infelicidade, os traços eram semelhantes, mas a beleza, jamais a mesma! 
Os homens estão vestidos com seus sherwalselabbadeh (calças largas e chapéus típicos) bem coloridos, além de camisas e botas. Eu corria riscos de não conseguir informações tão precisas para minhas reportagens, além da dificuldade de comunicação, sendo o árabe uma língua difícil de estudar, falar e escrever, não podia garantir boa recepção por parte dos nativos, ao sair entrevistando as pessoas.  Mesmo assim, como falo um pouco de árabe e tenho descendência, tenho conseguido me comunicar. Infelizmente, fiz bem poucas entrevistas, somente os homens me receberam, segundo o costume. E ainda há um grave problema denominado censura! Escrevo muito mais sobre o que observo e encontro registrado, do que recebo oralmente.
           Quanto à dança, ela consiste na entrada de cena de um homem idoso carregando um derbak (pequeno tambor feito de cilindro de madeira e pele de carneiro esticada). O nome do objeto a ser tocado dá origem ao nome do ritmo, e, consequentemente, da dança, a qual o passo típico é o Xime, ou tremido nos joelhos e no corpo todo, dependendo da intensidade, em que, a bailarina executa o movimento. O derbake vem seguido de uma turma de músicos com outros instrumentos como nay, ou flauta de bambu simples e longo e o mijwiz, uma flauta dupla, porém, mais curta.
          Quando a música começa a tocar, homens e mulheres seguram as mãos e começam a dançar formando duas colunas. Para a entonação Dalunah, a base de todos os Dabkes, basta bater no chão com um dos pés, enquanto outros batem palmas criando o ritmo apropriado. Então, abrem espaço para o canto improvisado. Uma mulher entra em cena com um jarro nas mãos balançando entre a cabeça e é seguida por outras como que numa competição.       É bom ressaltar que essas mulheres são, geralmente, de classe mais baixa e de menor cultura, pois mulheres casadas, de família já formada ou com tradição não praticam dança alguma, além de não poderem sair desacompanhadas. E, nem mesmo ao lado dos maridos, frequentam esses locais de festas. E foi daí que a dança do ventre se originou, de mulheres simples, escravas ou mulheres consideradas baixas e vulgares: daí a ideia negativa da expressão “odalisca”, as mais sérias, de alta patente, não praticam essas danças nem participam de eventos por imposição da religião e das crenças bastante exageradas. Mulheres de alta renda só praticam tais danças, bem às escondidas, (às escuras), muitas vezes, nem as famílias sabem.
           Da dança folclórica, os homens tomam parte com suas espadas. A bengala faz a adaptação dessa dança masculina para a feminina, fazendo o ritmo do mijwiz. Conforme o tempo vai passando, os mais velhos vêm participar também, segurando as mãos das mais jovens formando uma linha única e dando o mesmo passo. O homem e a mulher, em extremidades opostas, fazem passos diferentes para mostrarem quão competentes, ágeis e graciosos são. Eles dançam todos de preto e totalmente cobertos, mas o rosto do homem pode aparecer. O restante da turma acompanha com o bater de palmas e canta para revelar a sua felicidade. E, após várias voltas dadas pela grande roda que se forma, a dança se completa e todos podem continuar com a tradição.
          O homem mais idoso entra e anuncia que o suco de uva já foi fervido e já esfriou, então, já podem bebê-lo. Todos vão se servir e experimentam a bebida antes de iniciarem as degustações dos alimentos.  Infelizmente, essa tradição só permanece nos vilarejos, mas os passos do dabke são até hoje dançados em restaurantes, bares e festas típicas das colônias do povo árabe, inclusive, no Brasil.
Uma pedaço do capítulo um do livro "Às Escuras" 
Autora: Elis Murad Mohallem Ferreira, (2018), p.14

Comentários

  1. Esse livro é o que mais eu tenho uma relação de sentimento filial, foram mais de 14 anos trabalhando para que ele ficasse pronto.. ainda não existe publicação física, apenas virtual, no site kindle. A segunda parte dele tem pedaços autobiográficos, uma vez que os personagens principais existem. E o enredo ganhou vida... e retornou à ficção.

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